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UM PRESENTE PARA A MANTIQUEIRA

Na cordilheira de 500 quilômetros que atravessa os Estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro registra-se o oitavo índice mais rico em biodiversidade do mundo. A região também tem a maior reserva de água mineral do planeta, ao lado de um dos climas mais puros. “Podemos dizer que a Amazônia é um container cheio de pérolas enquanto a Serra da Mantiqueira é uma caixinha repleta de diamantes”, afirma José Roberto Manna de Deus, coordenador técnico do Projeto Águas da Mantiqueira, que traz um levantamento detalhado da riqueza de parte desse território feito de florestas, rios encachoeirados e muita vida. O diagnóstico com informações sobre a biodiversidade e os recursos hídricos da área pertencente ao município de Santo Antonio do Pinhal, além de propostas para o seu desenvolvimento sustentável, foi entregue na última segunda feira (21/08) ao prefeito da cidade, Clodomiro Correia de Toledo Jr.  O estudo recebeu o financiamento da Fundação Toyota do Brasil, com parceria da FUNDEPAG, entidade ligada à educação, pesquisa e conscientização ambiental.

 

Por Liane Alves

Durante 15 meses, 30 especialistas nas áreas de Biodiversividade (que inclui campos como o da zoologia, botânica, estudos dos insetos e microorganismos, por exemplo), Resíduos Sólidos e Esgotos, História Ambiental e Ocupação, ou Recursos Hidrícos, entre muitas outras, reuniram informações preciosas sobre a zona urbana e rural de Santo Antônio do Pinhal, que fica encrustada nas encostas da Serra da Mantiqueira a apenas 16 quilômetros de Campos do Jordão (SP). Estiveram também envolvidos a prefeitura da cidade, integrantes da Câmara Municipal e entidades civis, como a Associação de Produtores Rurais (Aprusap), Associação Comercial e Turística (Acasap) e a Associação dos Amigos Pró Santo Antonio do Pinhal, ou Pró-Pinhal.  Heinz N. Thielemann foi eleito, por voto unamine, Presidente do Conselho local do Projeto Águas da Mantiqueira. Os munícipes também se voluntariaram em alguns trabalhos e se reuniram por oito vezes em sessões especiais de discussão sobre o projeto.

Nas suas 160 páginas, o Águas da Mantiqueira, Desenvolvendo Vida  identifica zonas de fragilidade ambiental,
mapeia os recursos hídricos de dez microbacias hidrográficas  e mostra como foi o histórico da ocupação humana do município pesquisado, desde os índios Puri, os primeiros habitantes, até hoje. Também desenha situações futuras e sugere algumas soluções que apontam para uma agricultura e ocupação mais sustentáveis, além de sugestões para as áreas de Educação e Saúde.

Com esses dados em mãos, a cidade pode alicerçar políticas públicas e formatar com bases científicas o seu Plano Diretor, a ser elaborado ainda. O estudo também dará mais força para captar recursos junto a instituições nacionais e internacionais ligadas ao meio ambiente e sustentabilidade. “É todo um processo que acontece a partir de agora, que inclui novas discussões com a população e seus representantes na Câmara dos Vereadores. O estudo certamente pode embasar muitas decisões, mas ele é orgânico e passível de adaptações. Nada será imposto”, afirma Júnior, o prefeito. Transformado num projeto de lei, ele passará por consultas públicas até o envio para a Câmara dos Vereadores e sua aprovação final. Esse processo poderá levar até 12 meses, ou mesmo um pouco mais. Porém a partir da aprovação do Plano Diretor, Santo Antônio do Pinhal pode passar a ser um modelo para outras cidades da Serra da Mantiqueira. A vantagem do diagnóstico feito pelo Águas da Mantiqueira é que ele poderá servir de referência geral à outros municípios da serra, obviamente com algumas adaptações locais.

Descobertas inesperadas

No trecho escolhido como amostra, encontram-se dez importantes microbacias hidrográficas. Seus rios e riachos, dispostos em linha reta, alcançariam nada menos do que 590 quilômetros de extensão. “É a distância daqui a Curitiba. Se fosse colocada lado a lado, a população local, de apenas sete mil habitantes, não chegaria nem ao trevo da entrada da cidade”.  Isto é, é muita água numa rede altamente capilarizada de rios e cachoeiras e uma ocupação de baixa densidade que permite ainda uma proteção razoável aos mananciais. Mas com uma advertência grave: a Serra da Mantiqueira é como uma caixa d´água gigante coberta por uma tampa de cobertura vegetal. Sem a preservação da vegetação, a água simplesmente desaparece, pois é de lenta reposição.

Outro achado de impacto: “Aqui temos nada menos do que 28 espécies de abelhas nativas. Existem lugares no globo em que elas foram dizimadas, ou que só permanecem apenas uma ou duas espécies. Esses locais dariam tudo para ter uma riqueza natural de igual porte”, diz Beto Manna, o coordenador.  As abelhas são polinizadoras, e sem elas não há qualquer possibilidade de manutenção da vida vegetal em grande escala.

Surpreendente também é a presença de cinco espécies de felinos de grande e médio porte: pelas matas ainda perambulam a onça parda (conhecida também por suçuarana), o jaguardi, a jaguatirica e o gato selvagem. Câmeras-armadilhas foram espalhadas pelos fragmentos de florestas da região e vídeos flagraram exemplares de várias espécies da rica fauna local. Microorganismos e insetos também foram classificados, assim como 24 espécies de aves e mais de 10 de peixes (que pode chegar até 20, segundo o cálculo dos pesquisadores).

Embora riquíssima em biodiversividade, a Serra da Mantiqueira é uma área extremamente sensível. Várias medidas que envolvem políticas públicas são necessárias para que o homem possa conviver pacificamente com a natureza, e dela extrair seu sustento sem prejudicá-la. “Damos várias sugestões que podem beneficiar os agricultores, por exemplo, como as culturas que se adaptam melhor à região sem prejudicar o solo ou as outras espécies de seres vivos”, explica Beto Manna. Os fármacos encontrados também foram catalogados, para sua melhor proteção.

“As florestas são como grandes bibliotecas desconhecidas”, diz José Roberto Manna. Segundo ele, temos de saber que livros que estão lá, cuidar deles, conhecer sua utilidade para nós e preservar todo esse conjunto de vida que está intimamente ligado. A Educação que ensina as crianças a ter um contato próximo com essas bibliotecas e a Saúde que leva em conta suas ervas, raízes e sementes medicinais beneficia a população, e o próprio planeta.

A origem do projeto

Embora com tantos recursos hídricos à disposição, Santo Antônio do Pinhal não ficou imune à grave crise abastecimento de água em São Paulo em 2014: nessa época, caminhões-pipa tiveram de entrar na zona urbana da cidade para fornecer água para as pousadas locais. “Foi diante dessa cena, inédita para nós, que resolvemos fazer um projeto que levantasse nossos recursos naturais e revelasse o motivo daquela situação”, conta Fernando Veríssimo, presidente da Associação de Amigos Pró-Pinhal, que se empenhou ao lado do prefeito da cidade e outros moradores locais nesse projeto. Fernando havia sido tocado por uma palestra que ouviu no Seminário de Biodiversidade, Sustentabilidade e Cultura realizado na cidade cinco anos antes pela FUNDEPAG (Fundação de Desenvolvimento de Pesquisa do Agronegócio) e achou que o palestrante, o coordenador-técnico José Roberto Manna, seria a pessoa ideal para chefiar o diagnóstico da região. Inspirados pelo projeto socioambiental realizado em Extrema (MG), que paga aos produtores rurais pelos serviços ao meio ambiente prestados ao município com fundos públicos destinados à sustentabilidade, desenhou-se enfim o projeto Águas da Mantiqueira.

Depois de muita procura por patrocínio, a proposta foi enviada à Fundação Toyota do Brasil. E caiu nas mãos de Thais Guedes, coordenadora de projetos da entidade. “Me apaixonei pela proposta. E aguardamos sua aprovação, que demorou cerca de dois anos”. Foi o tempo necessário para aprofundar e aperfeiçoar as diretrizes do estudo. Além disso, o projeto também tinha outra grande vantagem para a empresa que o patrocinou: “Ele vai na direção de todos outros projetos financiados pela Fundação Toyota do Brasil, sempre ligados à sustentabilidade e à conservação do meio ambiente”, diz Percival Maiante, presidente da entidade. E, durante a apresentação do Águas da Mantiqueira na última segunda-feira, ele lembrou que a natureza sempre foi vital na cultura japonesa. “O Japão é um arquipélago com mais de 100 milhões de habitantes onde cada metro de verde merece respeito”, diz.
A parceria da FUNDEPAG também foi fundamental para a realização da pesquisa e seu relatório final.

Conhecido por ser um administrador eficiente da cidade (está em sua segunda gestão), o prefeito Júnior espera resolver todas as dúvidas com relação ao conteúdo do projeto em discussões com a população e em futuras audiências públicas. Junto com a Câmara dos Vereadores e a população local, ele imagina conseguir elaborar o novo Plano Diretor da cidade em 12 meses, “ou talvez um pouco mais”, afirma. “Mas é com muita alegria que espero deixar esse legado para Santo Antônio, não só para nós, mas também para nossos filhos e netos”.

Sementes sustentáveis como essa podem se disseminar, com o tempo,  por toda a Serra da Mantiqueira.

POR MAIS CONSCIÊNCIA

Como branca, eu tenho inúmeros privilégios que não me dou conta. E no ano em que se comemora 50 anos da morte do líder negro americano Martin Luther King, acredito que seja um bom momento para fazer essa reflexão.

E quem me enumera as vantagens que eu tenho sem me aperceber são mulheres e homens negros que estão numa roda de debates sobre o Privilégio Branco realizada em março de 2018 no palco do Auditório Cláudio Santoro, em Campos do Jordão.

Foi a primeira discussão da série Diálogos Impertinentes, promovida por Gustavo Prudente, Ricardo Artur Arroyo e sua empresa Sustenta Mundo – Culturas e Relações Sustentáveis, que tem o objetivo de trazer mais consciência ao ser humano, sobretudo aos que estão dispostos a rever ou afinar seus próprios valores, como eu e você. Nessa série de reflexões, a equipe de facilitadores aborda temas relacionados aos privilégios sociais.

Nessa primeira roda, eles convidaram três ativistas negros para, junto com público, falar sobre o que significa ser branco no Brasil hoje, e como isso impacta quem não é branco. Ao falar de sua própria vida, ou melhor, dos detalhes dolorosos e íntimos de sua própria vida, essas pessoas, que sofrem os mais sutis e cortantes preconceitos (justamente aqueles que não ditos diretamente, mas que podem ser percebidos pelo coração), me deixam com vergonha da minha inconsciência. Ou da minha omissão e silêncio, em muitos casos. Por exemplo, não me dou conta de que:

  • sou privilegiada quando entro num restaurante, ou numa loja, e o segurança não me olha desconfiado só por causa da cor da minha pele;

  • sou privilegiada quando outras crianças da minha idade não me chamam de feia por causa do meu nariz ou do meu cabelo;

  • sou privilegiada quando assisto, sem me causar qualquer incômodo, uma novela ou filme onde os brancos são os protagonistas e heróis, e os negros só ocupam um lugar secundário;

  • sou privilegiada quando todas minhas referências de beleza seguem padrões estéticos determinados pelos brancos e para brancos;

  • sou privilegiada quando sou contratada ou ganho uma promoção por ser branca, enquanto um negro é preterido e perde a vaga por ser negro;

E assim desfilam à minha frente uma série de outras circunstâncias que mostram a mim mesma o quanto de privilégios eu tenho sem ter uma consciência clara disso. Como diz Gustavo Prudente, tomo consciência de que “ser antirracista vai muito além de não fazer comentários racistas, compartilhar posts empáticos aos negros ou ir em manifestações”. É preciso ir além, e nem sempre estamos dispostos a ultrapassar essa fronteira. “Buscar ser antirracista implica no desenvolvimento da coragem de se arriscar a perder privilégios em nome de deixar de ser cúmplice com a perpetuação da estrutura racista. É atravessar o próprio medo em nome da luta pela dignidade de todos”, explica ele.

Sim, porque corro o risco de perder uma vaga se questiono uma contratação que pode ter sido feita por causa da minha cor. Ou me arrisco a ser condenada pela família se impeço meus filhos de assistirem um desenho animado com cenas sutilmente racistas. “Outro dia vi um filme da Barbie em que ela sai do mar com os cabelos loiros e soltos enquanto sua amiga negra sai com os cabelos duros. O comentário dela ao ver a amiga é alguma coisa do gênero: “Hum, que engraçado isso…”. Eu não vou deixar minha filha ver um desenho assim, com uma cena dessas. Porque ali já está embutida a noção de que o branco é bonito e o negro é feio, estranho, porque o engraçado aí está no mesmo sentido de ser estranho, diferente, inferior”, diz uma participante do público, casada com um negro. “Temos de estar vigilantes e atentos com tudo o que as crianças consomem em termos de cultura racista”, afirma. E isso requer uma postura ativa e consciente que nos obriga a nos expor, a sair da zona de conforto, a dizer “não, eu me recuso a compactuar com isso”. Sem medo de críticas ao mostrar abertamente minha indignação e inconformidade com isso.

Quando se tem consciência do próprio privilégio, não dá mais para se omitir e fingir que não se vê a discriminação que é feita com o outro.

Coloridos como as borboletas

Uma das participantes do grupo de debates reconhece que nunca teve consciência do racismo antes de vivenciá-lo a partir do seu casamento com um negro. “Minha família rejeitou a união. O mais incrível disso é que eu sou branca, mas minha irmã é morena: temos ancestrais negros na família”, ela conta. Dolores Medeiros, uma psicóloga especialista em Constelações Familiares que trabalha no Espaço Quintessência, em Santo Antônio do Pinhal (SP), concorda e acrescenta: “É muito comum ver negros casarem com mulheres brancas. E isso pode ser bem dolorido para as mulheres negras”, ela diz. Não é o caso dela, que é casada com o ativista negro Dojival Vieira. Mas ela sabe que essa pode ser uma situação comum. E vejo que um dos efeitos mais perversos do privilégio branco é que ele pode alcançar os próprios negros, ao se transformar em algo desejável também para eles. Meu coração fica cada vez mais apertado.

Relacionamentos entre negros e brancos, nas suas diferentes gradações de cor, é algo muito comum no Brasil. Mas nem sempre em termos de igualdade. Poucos admitem essa realidade evidente quando olham o próprio passado de suas famílias. Convenhamos: ninguém que tenha uma família radicada há muito tempo no Brasil está isento de ter antepassados negros. Mas quem tem coragem de assumir? Nos orgulhamos de sermos quatrocentões, mas esquecemos o restante da história. A família Camargo de Almeida, que é minha família original por parte paterna, por exemplo, tem centenas de anos em terras brasileiras, talvez mais de 400. Somos descendentes do Barão de Mambucaba, cidadezinha perto da região de Paraty. Quem garante o nosso passado? Temos milhões de “Escravas Isauras” no país – gente que parece branca, mas que tem uma porcentagem de características genéticas latentes relacionadas ao negro ou índio. Quem disse que o avô do meu tataravô, por exemplo, não se encantou por uma dessas mulheres? Ou que teve um relacionamento com uma escrava e assumiu os filhos? Nós, brasileiros, somos negros e brancos do café com leite mais branco possível ao preto mais retinto. Vamos deixar de ser bestas, então, é difícil encontrar alguma pseudo-pureza racial por aqui (se ela existisse realmente). E esse fato, que, na verdade, deveria ser motivo de orgulho e nos unir, infelizmente nos separa. E por motivos bem questionáveis.

Não existem raças, e esse fato é mais do que comprovado cientificamente. Temos em nosso DNA não só genes da nossa própria espécie, como de espécies extintas (como os Neanderthais), além da presença de genes de várias origens. Enfim, somos todos juntos e misturados. É o que me garante Dojival Vieira, jornalista e dono da agência de notícias Afropress. E ele se refere a algo que é um bálsamo para o meu coração: somos uma mistura danada de cruzamentos de muitas linhagens genéticas. Não existe nada além do que seres humanos, com uma cabeça, dois braços, duas pernas e sangue vermelho. Nenhuma raça é superior à outra, porque elas simplesmente não existem: somos apenas descendentes de hominídeos originários da África ou Austrália, que foram mudando suas características ao correr do tempo, e de acordo com diversas circunstâncias.

“O importante é enxergar a beleza na diversidade dos seres. Ao afirmar que existe uma raça, e que ela é superior a outra, me torno racialista. O movimento negro americano do Black Power, por exemplo, é racialista”, ele diz. O racialismo nos induz a viver sem interação, cada um no seu quadrado, e se achando o máximo dentro dele. Gosto do tom tranquilo, e ao mesmo tempo firme, de Dojival. Acredito que ele já tenha passado muita raiva e mágoa por causa do preconceito, e que as tenha ultrapassado. Ele e Gustavo Prudente, o facilitador do debate, um branco e um negro, são amigos e moram em Santo Antônio do Pinhal, aqui do ladinho de Campos do Jordão. São exemplos inspiradores de que é perfeitamente possível abrir mão do privilégio, de um lado, e do ressentimento, do outro. Na paz.

Martin Luther King, no seu célebre discurso I have a dream (Eu tenho um sonho), dizia que imaginava tempos futuros nos quais “minhas quatro pequenas crianças viverão em uma nação onde não serão julgadas pela cor de sua pele, mas pelo conteúdo do seu caráter”. E ele continuava a falar sobre seu desejo: “E onde meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos negros e meninas negras como irmãs e irmãos”. Gustavo e Dojival já são assim. E os filhos deles provavelmente serão assim também. Meu coração começa a se aliviar.

Termino a palestra com um sorrisão daqueles por causa da afirmação pró-diversividade e pró-igualdade racial feita por Dojival Vieira. A luta contra a discriminação continua. Mas já se pode dar outros passos além disso, como enxergar a beleza da multiplicidade entre os seres e o reconhecimento da igualdade de seus direitos como algo absolutamente normal e inquestionável.

Quando criança, queria ter cabelos longos e verdes, como as sereias. Não me importaria se minha pele fosse azul, nem que minhas pupilas fossem douradas, como os seres de Avatar. Seria lindo se eu pudesse ser assim, multicolorida. E que todos pudessem ser assim também. Já imaginou quantas opções genéticas teriam nossos descendentes? Cintilantes, a ostentar as 100 mil opções de tonalidades que nos oferecem o espectro visível das cores, não teríamos mais porque brigar. Seríamos tão misturados que ficaria impossível afirmar qualquer tipo de racialidade ou diferença entre nós. E ficaria de um ridículo total alguém dizer algo como “eu sou mais laranja-avermelhado-dourado-com-tonalidades-violáceas do que você, viu?”.

E, nesse exemplo acima, podemos ver claramente que o problema nunca foi a cor. Mas, sim, o nosso nível de consciência.

 

. O segundo tema a ser abordado pelos Diálogos Impertinentes no Auditório Cláudio Santoro será o Privilégio Hétero, em abril próximo.

 

Foto: Antonio Milton Ito Soares

CAFÉ NO BOSQUE

 

Nessa rua, nessa rua tem um bosque

E ele não se chama Solidão.Todos o conhecem por Bosque do Silêncio, nome tão poético quanto o da canção de roda. E aqui a natureza tem mesmo o ar de uma floresta mágica: silenciosa, recolhida, misteriosa.

Parcialmente natural e parcialmente tratado como jardim, em especial na parte gramada da entrada, o bosque tem uma área de 120 mil metros quadrados, um bom tamanho para um parque dentro de uma cidade, no caso, Campos do Jordão. São 28 travessias que podem ser percorridas em dois quilômetros de passarelas, em trilhas que podem levar de 1 a 3 horas.

Ali, lagos com nenúfares são atravessados por pontes, e passarelas de madeira correm por entre hortênsias e plantas aquáticas. Há todo um equipamento seguro para a prática de tirolesa e caminhos entre as copas das árvores para a prática de arvorismo, atividades propostas pela empresa Altus Turismo Ecológico, assim como uma arena aramada para Paint ball, esporte mais praticado nos Estados Unidos do que o surfe.

Altos pinheiros protegem um spa construído como uma cabana de madeira, e canteiros de coloridas Impatiens (a prima rica da nossa Maria-sem-vergonharodeiam um café com deck ao ar livre. Tudo é limpo e muito cuidado por lá, e uma atividade fica longe da outra.

A ideia do Café no Bosque, uma das principais atrações do parque, é oferecer o que de melhor a Serra da Mantiqueira é capaz de produzir na área da alimentação. “O turista muitas vezes não tem tempo de ficar rodando por aí para conhecer e provar tudo o que existe nesses vales e montanhas, e a Serra se estende por mais de 500 quilômetros… Então procurei reunir uma amostra das coisas mais gostosas que são produzidas na região”, diz Marco Ayres, o proprietário do café.

Como sommelier da Enoteca Fasano em Campos do Jordão, Marco adota o mesmo sistema que oferecia aos seus sofisticados clientes: traz amostras para degustação de muitos produtos vendidos. Os queijos premiados da Fazenda Pavão na vizinha Serra do Salitre (que espero um dia conhecer, pois ela é também aberta à visitação) são trazidos em pequenas lascas, em três estágios diferentes de maturação. No geral, os queijos se assemelham ao Grana Padano italiano, e mesmo ao Parmegianno Regianno, e podem muito bem substituí-los.  Ou ele pode apresentar vinhos que se parecem com o Madeira, tanto o seco como o licoroso, feito originalmente por um português que veio morar aqui no século passado. A produção vinícola do Madeira é continuada hoje pela família.

O mel mais exótico que Marco oferece é obtido das flores brancas e perfumadas das floradas das fazendas de café, mas lá existem de muitos outras espécies. E ele também apresenta os mais diferentes tipos de geleias (comprei uma lá, de laranja, que me fez lembrar demais das marmelades inglesas). Outra que faz sucesso é a de physalis, uma frutinha amarela envolta por folhas cor de palha, que chegou nos mercados daqui como exótica, mas que é bem brasileira. No Brasil, ela é chamada de joá-de-casaca, camapum ou saco-de-bode. Gostosa, tem inúmeros benefícios medicinais para a saúde.  Na Serra, ela é cultivada sem qualquer tipo de agrotóxicos, pois se adapta facilmente ao solo. Já não é caso das frutinhas vindas de fora.

As cervejas artesanais, desde daquelas feitas em garagem, mas muito saborosas, até marcas conceituadas ou de fabricação exclusiva, são um universo à parte. São inúmeras, mas essas você vai ter de comprar seguindo uma ou outra indicação do dono da cafeteria, é claro, assim como os vinhos de altitude. Ele não pode abrir uma garrafa só para tirar uma amostra… Mas você pode experimentar os derivados de suínos em lasquinhas, como as de presunto cru de tipo ibérico, originados das melhores fazendas da região e beber com as cervejas, ou pedir uma deliciosa porção de queijos e frios que está no cardápio. 

O Café no Bosque ensaia lançar um menu criativo para o almoço durante os finais de semana, mas até isso acontecer, já é possível consumir salgadinhos para beliscar e sanduíches. E não saia de lá antes de provar uma fatia de cheesecake feito com frutas vermelhas e massa de amêndoas. O pessoal do Trip Advisor já o classifica como o melhor da Mantiqueira (o parque tem o Certificado de Excelência do site também).

Endereço: Avenida Senador Roberto Simonsen, 1724 – Vila Inglesa – Campos do Jordão

A entrada é gratuita, e ele funciona das 9h00 às 18h00.

A administração do Bosque do Silêncio é feita pela empresa Altus Turismo Ecológico.

 

 

CAMINHO DA ROÇA

 

A casa parece ter saído do desenho da Branca de Neve. E tenho a impressão de ter vistos um ou dois duendes no jardim, perto das dálias vermelhas (ah, há quanto tempo não via dálias vermelhas, flores da minha infância…). São de barro, tudo bem, não enlouqueci. Mas combinam muito bem com o lugar.

Acontece que essa casinha branca com janelas e portais azuis fica no caminho de casa. E aí é acontece a perdição. Para não comprar nada lá, tenho de amarrar as mãos no bolso. A loja Caminho da Roça é uma tentação.

E o que tem lá dentro? Tudo, tudo o que você possa imaginar para enfeitar uma casa.

De mantas artesanais feitas em teares manuais aqui na Serra da Mantiqueira a coelhinhos de algodão importados que parecem brinquedos de criança do século XIX. De Cds de músicas relaxantes a óleos essenciais, de colchas em patchwork a capachos engraçados de boas-vindas.

Tem ovelhinhas para colocar embaixo na janela, sapinhos e tartarugas para o jardim. Todos de cerâmica.

Tapetes rústicos de Minas, caixinhas de música alemãs, ícones de madeira italianos. E presépios de várias partes do mundo.

Da China, só o melhor: jogos de taças gigantes coloridas para se colocar velas, bibelôs em forma de coelhos e pássaros, jogos de pratos, copos e sousplats, candelabros, enfeites de parede e lanternas em ferro… Tudo bem, também tem aquelas peças pseudo-provençais hiperromânticas, que particularmente acho muito fake, mas reconheço que tem muita gente que adora. Enfim, entre as centenas de objetos distribuídos em cinco pequenos ambientes, dá para ficar um bom tempo a descobrir preciosidades. 

E ainda é possível encontrar novas surpresas a cada semana.

Mérito da Rosana, a dona, que há quase vinte anos faz questão de manter as ofertas do Caminho da Roça bem sortidas.

   O saboroso picles artesanal Granny´s, com receita americana mas feito na serra.

Ultimamente passo lá para comprar os picles crocantes feitos pela sogra da Débora que, junto com a Cilene, atende os clientes da loja. Picles crocantes com fatias de cebola e pedacinhos de pimentões e sementes de aipo são bem difíceis de se achar por aqui no Brasil. E Débora me conta parte do segredo: a receita foi ensinada por uma americana, Louise, que viveu em Campos do Jordão por muitos anos, e que ensinou o segredo da crocância à Romilda, a sua sogra. Foi Louise também que mandou fazer os rótulos pintados à mão (e depois impressos, é claro) dentro do mais puro estilo de desenho artesanal dos Estados Unidos. E assim nasceu a marca Granny´s. Louise vendia os vidros e Romilda executava suas receitas, que incluem relishes e geléias de framboesa e amora. E assim foi durante muito tempo. Até que um dia Louise se cansou e voltou para os Estados Unidos. Doou todos os rótulos impressos para Romilda, e pediu para ela tocar o negócio em frente. E é o que Romilda faz até hoje para ajudar no orçamento.

Quando compro um produto artesanal, gosto sempre de saber sua história. Porque assim ele ganha um sabor diferente, uma memória afetiva. E fica muito mais gostoso. Na nossa happy hour, comemos os picles Granny’s com um pão quentinho coberto por uma crosta de queijo, comprado ali mesmo em frente na Padaria Roma, e requeijão (a sugestão é da Débora também). Acompanhamos com um dos 50 tipos de cerveja artesanal feitos por aqui.

Definitivamente Campos do Jordão não é um bom lugar para se emagrecer.

Caminho da Roça: Rua Orivaldo Lima Cardoso, 105 – Campos do Jordão

 

 

CERVEJA NA FAZENDA

 

O nascimento de uma cervejaria artesanal implantada no meio de uma fazenda pode começar muito tempo antes.

O casal Fabricio e Júnia, por exemplo, eram executivos com especialização em logística numa grande empresa de armazenamento em Jundiaí, São Paulo. Ganhavam bem, tinham um futuro tranquilo e estável à sua frente. Mas felizes, felizes mesmo, não eram. E logo começaram a sentir aquele incômodo no coração que sussurra que está mais do que na hora de mudar de vida. “Não era um trabalho criativo, a gente sentia que não estava produzindo nada de verdadeiramente nosso, com a nossa marca. E não era manual, artesanal. Só ficávamos horas diante da tela do computados fazendo cálculos”, diz Fabricio Faria de Almeida, que não arrepende nem por um momento de ter vindo morar com sua mulher Júnia para a Serra da Mantiqueira.

E qual a experiência artesanal que eles tinham para mergulhar em outro projeto de vida? Hummm. Eles tinham produzido a própria cerveja servida no casamento deles. E o que era apenas uma brincadeira, gerou comentários elogiosos. “Por que vocês não fazem mais cervejas assim?”, “Nossa, cara, essa cerveja está muito boa”… Estimulados pelos elogios, começaram mergulhar mais no assunto e a fazer novas experiências, que também resultaram em bons produtos, com um ou outro errinho de principiantes, é claro.

Mas como mudar de vida, e para onde? Era uma questão. Fabrício tinha passado a infância numa fazenda na Serra da Mantiqueira. Mas era de café orgânico, criação de porcos e frutas exóticas. Não era bem o que eles tinham em mente. Mas se… E esse “mas se” foi crescendo na mente deles, até que um dia finalmente desenhou-se a opção definitiva: implantar uma cervejaria dentro da fazenda, aberta aos visitantes, com cervejas artesanais feitas com nuances de sabores vindos de produtos da propriedade. Isto é, cervejas feitas com lúpulo e limão cravo, ou também pitaya e amoras, maracujá e chá de cáscara, que é a casca junto com parte da polpa da frutinha do café. E assim por diante. Além de originais, elas poderiam ser deliciosas e refrescantes…

A ideia era tão boa que eles não tiveram mais dúvidas, mesmo que o projeto tivesse seus riscos. “A fazenda já produzia tudo organicamente. E nós queríamos fazer uma cerveja artesanal sustentável, cuja produção fosse respeitosa com a terra. Se a gente tirasse um quilo da terra, teríamos de devolver um quilo” conta Júnia Falcão, sócia-proprietária da cervejaria. E é isso mesmo o que acontece por lá: o bagaço do malte que é descartado após a produção, por exemplo, é secado ao sol e dado como alimento aos porcos da fazenda. Isso significa o aproveitamento de 15 toneladas/mês de dejetos que deveriam ser jogados na área da propriedade ou transportado em caminhões para fora, manobra de difícil execução. Fabrício e Júnia também fazem experimentos com fermentos naturais da Serra da Mantiqueira, além do tradicional belga empregado na produção, para aproveitar o que região produz. Tudo é pensado para que haja um máximo aproveitamento dos insumos utilizados.

O nome da cervejaria, ZalaZ, não significa nada. Apenas tem uma sonoridade que agradou ao casal quando pensavam no rótulo da cerveja. É um palímetro, isto é, uma palavra que pode ser ler nos dois sentidos. E como o nome não tinha um sentido especial, acharam um boa ideia atribuir à ele tudo o que tinham em mente: fabricar produtos de qualidade de forma totalmente sustentável.

E com uma produção de nove mil litros por mês, a Zalaz já é bem conhecida na região. Com outra característica bem original: a produção de cada rótulo é limitada. A cerveja feita com pitaya, uma fruta exótica cor-de-rosa originalmente vinda da Colômbia, por exemplo, tem de aguardar a colheita da fruta e o tempo necessário, um ano, para que o seu sabor seja apurado em barris de carvalho. É um processo demorado e artesanal, e quando o número de garrafas produzido acaba, é necessário esperar a outra leva da produção, que pode demorar um tempinho. Como todos produtos da Serra da Mantiqueira, ela é sazonal. Não adiante querer, por exemplo, pinhão fora da estação, ou shitake num verão úmido e chuvoso, quando ele precisa do frio e secura do inverno. Tudo tem o seu período próprio. E assim também acontece com as cervejas que levam produtos de lá. 

 Por tudo isso, não espere o preço de uma garrafa de cerveja industrial. Em média, as cervejas da ZalaZ custam 30,00. E não é caro, pelo custo do processo envolvido. Além disso, tem toda a experiência deliciosa de se consumir um produto dentro de uma fazenda orgânica. As cervejas também são acompanhadas de petiscos de boa qualidade, como o torresmo ou o presunto cru, vindos da criação local de porcos. Algumas vezes, jazz bands são convidadas para acompanhar a degustação, ou então, bandas para animar o Carnaval com marchinhas.

Confira as datas de abertura da Fazenda Santa Terezinha, onde está a Cervejaria Zalaz, no site www.zalas.com.br ou em sua página no Facebook.

 

Fotos/Slider: florada do café orgânico da Fazenda Santa Terezinha – Divulgação

Fotos do casal/Cervejaria ZalaZ à noite: Divulgação

 

 

AMOR E APRENDIZADO

Meio ponto, uma laçada, meio ponto, uma laçada…

É quase uma meditação. A quietude me faz voltar para o centro do meu ser. Os erros mostram minha ansiedade e a vontade de acertar sempre. Esqueço que eles fazem parte de qualquer processo de aprendizado. E se o ponto ficou frouxo, e se a carreira está desigual, não preciso sofrer por isso. Posso desmanchá-los. Ou posso deixar assim mesmo, pois é uma peça feita por uma principiante. Por que desejar o acabamento impecável de uma máquina? Sou humana, com o tricô aprendo que sou humana, que o fazer requer experiência, e que eu não a tenho. Em poucos pontos trançados, ele me faz ver como eu sou exigente comigo mesma. Como sou intolerante com minhas faltas. E se assim é comigo, devo também ser intolerante com outros… O sonho da perfeição. O orgulho da perfeição. Por que preciso querer sempre ser perfeita? Para ser amada e admirada? Será que não existe amor suficiente neste mundo para os imperfeitos? Já não é tempo de aceitar e amar a imperfeição em mim?  E nos outros?

Nas minhas mãos, a lã natural corre enquanto faço essas perguntas internamente. Com agulhas gigantes de tricô, sigo a orientação das professoras. É possível se tricotar uma mantinha curta, ou uma gola de lã para o pescoço, durante a oficina. Faço o mesmo caminho de mães, avós e mulheres da minha ancestralidade que tricotavam roupas para seus filhos, netos ou maridos. Mas hoje, nessa oficina de tricô com lã natural aqui em Campos do Jordão, há também homens, namorados, pais e maridos, que desejam ter essa experiência única numa viagem de lazer. Eles, como eu, escolheram qual atividade que gostariam de fazer no site desse projeto (são muitas), agendaram o dia, e estão lá comigo para, basicamente, aprender. E, se não forem tão exigentes consigo mesmos, também para se divertir e rir dos seus enganos. Porque a gente acaba é rindo mesmo de nossas pretensões, talvez vencidos pelo erro, talvez apenas por se dar conta dos processos internos que uma atividade manual pode acarretar. E quando isso acontece, que delícia…  Podemos relaxar diante da nossa própria humanidade, de nossa própria limitação. E aprender não só essa, como muitas outras lições. Ter insights profundos. E rir, rir muito de nós mesmos, abaixar um pouquinho o volume de nossa autoimportância… Um trabalho manual é sempre uma escola de autoconhecimento, para quem quiser aproveitar essa oportunidade. Ou apenas lazer despretensioso. Qualquer alternativa é válida e divertida.

É também uma forma de ter uma deliciosa experiência numa viagem. Algo que fica na memória e provoca sentimentos. E que depois pode ser contado em forma de histórias para a família e amigos. Não existe recompensa maior do que essa: passar algumas horas fazendo algo que não se faz mais, com prazer, na companhia de outras pessoas e de muitos risos, além do bônus da aprendizagem interior. E terminar essa experiência gratificante com um chá (gratuito), com geleias e bolachinhas da roça que podem ser adquiridos no local.

E o Projeto Mãostiqueiras tem boas surpresas, como essa da oficina, na sua história de apenas um ano. Idealizado por Juliana Muller Bastos, ela mesma uma artesã de lã formada em administração de empresas, hoje a casa onde se reúnem 18 artesãs recebe cerca de 400 visitantes por mês, e mais de 800 na temporada de julho. Juliana é paulista, vinda de famílias do Paraná e de Santa Catarina. Como artesã, sempre gostou de trabalhar com lã natural: faz esculturas em forma do Pequeno Príncipe ou da Família Sagrada, por exemplo, com o emprego da técnica de feltragem. E aprendeu como fiar, tecer e criar com lã natural com as comunidades que ainda mantém essa tradição no Sul de Minas e em Cunha, em São Paulo (exemplos de seu trabalho podem ser vistos na casa da Mãostiqueiras, onde são feitas as oficinas). Ali também é exposto e vendido o artesanato das 18 mulheres da região que fazem parte desse projeto que tem o selo do Programa de Incentivo à Cultura do Estado de São Paulo, o Proac.

Foi o talento de Juliana como administradora de empresas que garantiu que o projeto se autosustentasse. As artesãs ganham pela produção e também pela venda de seus produtos. E aqui entra um detalhe importante desse projeto premiado que promove a interação com a comunidade local: se elas ganhassem apenas pela venda das peças, o projeto correria o risco de se extinguir, pois às vezes elas demoram para serem vendidas. Para sustentar todo o processo, que inclui compra de equipamentos, cursos de capacitação para as artesãs dominarem outras técnicas e apoio na divulgação durante o primeiro ano do projeto, foi necessário procurar o apoio de patrocinadores parceiros. Mas a ideia de demonstrar um processo artesanal aos visitantes e integrar a comunidade local era tão fascinante que Juliana ganhou rapidamente a parceria da empresa de ônibus Pássaro Marron e Litorânea, que serve a região. 

O Projeto Mãostiqueiras, que fica em Campos do Jordão, está aberto todos os dias exceto às terças-feiras. Mas se você quiser acompanhar o trabalho das artesãs, visite a casa na quarta-feira à tarde. 

Um mundo de encantamentos

A casa do Projeto Mãostiqueiras, uma união da palavra mão com Mantiqueira, é um lugar simples e ao mesmo tempo fascinante. Lá, Juliana e algumas de suas companheiras de trabalho ensinam como a lã do carneiro tosquiado é penteada, cardada, e se torna fio na roca. Ou como depois é tingida com tinturas naturais, vindas de plantas ou até mesmo de insetos esmagados, como a cochinilha, que dá um lindo tom escarlate. Ela também traz para os visitantes a maravilha que é o mundo de quem tece artesanalmente, ao mostrar os teares manuais e mantas confeccionadas por lá. Ou, então, a ensinar nas oficinas de tear para adultos e crianças.

Outro ponto importante: a lã do Mãostiqueiras é fornecida gratuitamente pelos produtores locais, que criam ovelhas rústicas mais para corte do que para produção de lã. Para eles foi um alívio, porque não sabiam o que fazer com a lã tosquiada. Ela não podia sequer ser incinerada, porque a lã natural é anticombustível (o que foi uma surpresa para mim; a lã combustível é a artificial, feita com petróleo). Depois de chegar no projeto, a lã é lavada e cardada, isto é, passa por um processo de limpeza até virar mechas ou fios em tons crus, cinzentos e marrons. Se optar, o aluno da oficina também pode trabalhar com lãs mais finas e macias, que vem do Sul do país. Mas daí o preço é outro, pois ela é vendida pelos produtores gaúchos em dólares, pois trata-se quase de uma raridade pouco disponível. Para começar, aconselho a lã rústica mesmo. E se quiser, depois, você pode encomendar a lã natural macia pelo site do projeto ou, então, comprar lá mesmo e, senão for uma quantidade muito grande, levar para casa. A oficina custa 120,00 e fornece a lã rústica para o tricô.

As crianças podem conhecer três ovelhas criadas no terreno e acompanhar como é o processo que transforma a lã em fio num pequeno museu. Também podem participar de oficinas preparadas para elas, como o tear de papelão e mesmo o tricô com agulhas gigantes que, por causa dos pontos maiores, dá mais velocidade ao processo de tricotar uma manta. 

Projeto Mãostiqueiras – Rua Arthur Ramazzi, 100 – Campos do Jordão – telefone: 99764-2718. De segunda a domingo, exceto às terças-feiras, das 10h00 às 18 horas.

site:www.maostiqueiras.com.br

 

Fotos: Antonio Milton Ito Soares

 

 

 

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