Um dos grandes passeios da Nova Mantiqueira é conhecer os restaurantes, lojas e cervejarias das propriedades rurais locais. É uma delícia passar algumas horas em cada fazenda, adquirir alguns dos seus produtos ou saboreá-los em pratos deliciosos. Em algumas delas, como a Fazenda Água da Capoeira, por exemplo, na região de Santo Antônio do Pinhal (SP), é possível se encher uma sacola com as frutas da estação colhidas no pé ou escolher verduras na horta orgânica. Em outras pequenas propriedades, pode-se visitar plantações de flores comestíveis produzidas por meio de hidroponia e sem uso de defensivos agrícolas, como as encontradas na Gastro Flowers, em Campos de Jordão (SP), além de se poder comprar geleias, doces e óleos artesanais feitos com elas. Já na famosa Feira de Orgânicos de Gonçalves (MG), aos sábados de manhã, produtores locais expõem frutas, legumes e verduras da região distribuídos em várias barraquinhas. Cada um deles tem a sua história, e é um prazer a mais conhecê-las.
Uma das propriedades mais importantes da região é a Fazenda Santa Terezinha, que tem mais de 100 anos e fica na região de Paraisópolis (MG). O café de lá, cuja produção é vendida quase totalmente para o exterior, ganhou em 2001 a primeira colocação no prêmio mais prestigiado da área no Brasil, o Cup of Excellence, com uma pontuação que alcançou a nota 97,5 sobre 100 pontos, marca até hoje insuperável no mundo.
Os pés de café da Santa Terezinha são plantados de forma peculiar, à sombra de outras árvores maiores como a taiuveira e, por isso, a sua produção é conhecida como de “café sombreado”, um sistema que confere bastante robustez à planta. Clima, solo, altitude, forma de colheita (só os grãos maduros são colhidos, o que encarece bastante a produção, pois a seleção é manual) e o trabalho realizado no terreiro são os itens que determinam um bom café – e todos os eles são levados em conta. “Produzo 300 sacas por ano de diferentes tipos de café, penso em chegar a 600. Mas o mais importante para mim é que a produção seja de alta qualidade”, diz o engenheiro agrônomo e proprietário Paulo Sérgio de Almeida, que hoje tem clientes em países como Japão e Estados Unidos. Para o consumidor, 1 kg do café torrado da Fazenda Santa Terezinha custa de 70 a 110,00, conforme a safra. É caro. Porém, trata-se daquele que é considerado o melhor café orgânico do mundo.
E há um forte motivo para que a produção da fazenda Santa Terezinha seja totalmente orgânica. Há 33 anos atrás, Paulo teve de fazer um transplante de rim. A provável causa: intoxicação involuntária por agrotóxicos. “Prometi a mim mesmo nunca mais envenenar ninguém com o seu uso”, diz ele. Seu irmão, Elder, que cria suínos, adotou a ideia e também dá uma alimentação especial aos porcos que a fazenda produz. Também seu filho, Fabrício, dono de uma micro-cervejaria dentro da Santa Terezinha, a ZalaZ, não usa aditivos químicos prejudiciais à saúde em suas cervejas artesanais (conheça mais sobre ela em CERVEJA NA FAZENDA.
Tudo que é servido ali obedece a um rigoroso critério de qualidade e sabor. As criativas receitas das cervejas artesanais produzidas na propriedade, que podem levar ingredientes como café, amora, pitanga, chá de cáscara (casca e polpa de café), limão cravo ou maracujá, assim como os petiscos e pratos que as acompanham, atestam essa preocupação. Você não poderá circular livremente pela fazenda para conhecer os pés de café e a criação de porcos, mas poderá entrar para degustar as cervejas na sua microcervejaria, um bom programa para os sábados, quando ela abre para visitação. Eventualmente haverá música ao vico, com bandas de jazz ou outro tipo de música (o calendário de eventos da fazenda está disponível no site www.zalaz.com.br).
Outra fazenda que vale a pena conhecer é o Viveiro Frutopia, e o restaurante Entre Vilas, a 1600 metros de altitude, em São Bento do Sapucaí (MG). Há guias locais que acompanham a visita à fazenda, mas é sempre bom confirmar antes se estarão disponíveis (aliás, no universo rural é sempre bom checar tudo nos sites correspondentes antes de sair de casa). E a experiência em Frutopia vale a pena, pela surpresa de cada item plantado por lá. Quando decidiu fazer vinhos de altitude de qualidade com uvas europeias, cultivar frutas exóticas delicadas, como amoras e framboesas ou, mais ainda, plantar lúpulo para a produção de cervejas (feito que até então ninguém tinha conseguido no Brasil), não houve quem não chamasse Rodrigo Veraldi de maluco. Por isso, ele não teve dúvidas em batizar sua propriedade de Frutopia, uma mistura da palavra fruta com utopia.
Era um sonho mesmo, mas que deu certo. Uma cobertura de plástico salva suas videiras da chuva e ele já está na sua terceira safra de vinhos. As plantações da fazenda hoje se espalham em 30 tipos diferentes de amora e outro tanto de framboesa, além de outras frutas. Mas a grande vitória foi o lúpulo: depois experimentar plantar diferentes espécies, uma finalmente se adaptou perfeitamente à região. E ele se tornou o primeiro produtor de lúpulo do Brasil, certamente um negócio que traz além de muito trabalho, muito lucro. Numa palestra aos alunos de gastronomia do Senac no final do ano passado, ele não deixou de aconselhar. “Sejam chefs, experimentem novas receitas, tudo isso é muito bom, mas não deixem de pensar na possibilidade de se tornarem produtores rurais”. Por que não?
O casal de proprietários da fazenda Oliq também resolveu ousar e mudar de vida. Os dois compraram terras para plantar oliveiras e colher azeitonas que hoje resultam em azeites de raro sabor. A plantação de oliveiras na Mantiqueira começou ainda na década de 30, perto da região de Maria da Fé, um dos pontos mais altos da serra, a partir de espécies europeias cultivadas por imigrantes portugueses. Não deu certo, sobretudo pela falta de tecnologia da época. Numa segunda onda, a partir de 1970, a Epamig, Fazenda Experimenta da Empresa de Pesquisas Agropecuárias de Minas Gerais, com o uso de novas técnicas, conseguiu que as oliveiras finalmente se adaptassem à Serra a partir de uma espécie brasileira, e mineira, a Maria da Fé. A Oliq nasce dessa segunda fase em duas fazendas unidas, a Santo Antônio do Bugre e a São José do Cantagalo. O lagar da propriedade e o armazém para degustação ficam na Santo Antônio do Bugre, na região de Santo Antônio do Pinhal (SP), e o mapa pode ser baixado direto do site da fazenda.
No armazém local, além dos vários azeites experimentados num tipo de pão de sabor suave, a fougasse (o parente francês da focaccia), privilegia-se ainda os doces feitos com frutas de altitude. Os nomes são pouco conhecidos, e os sabores, exóticos. Fragaia, japoca, grumixama (cereja do mato), além da uvaia e do cambuci, se transformam em doces diversos vendidos no pequeno armazém à moda antiga. Ali também pode se encontrar travesseiros de lavanda bordados, sais de banho e outros mimos, numa produção que procura se utilizar da mão de obra local.
Ainda dá espaço para salivar mais? Então vamos para a À CAÇA DE SABORES e GASTRONOMIA CRIATIVA .
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